Postagem em destaque

Livro: Uma Síntese a Filosofia Medieval

  Olá pessoal! Depois de um tempo, estou retomando as atividades por aqui. Uma das razões que contribui para esse hiato foi a falta de tempo...

sexta-feira, 29 de novembro de 2019

NICOLAS MALEBRANCHE - Ontologismo


NICOLAS MALEBRANCHE
No século XVII, tentar harmonizar a razão e a fé era mais ou menos como colocar na mesma panela um litro de água fervendo (Santo Agostinho) e um pedaço de gelo (Descartes). Mesmo assim, Malebranche conseguiu. Vamos ver como.
A vida
Nicolas Malebranche nasceu em Paris, em 1638, caçula de uma ninhada de doze filhos. Por não ser propriamente muito saudável, fez todo o primário em casa e só mais tarde, ao chegar à maioridade, matriculou-se nos cursos de filosofia da Sorbonne. Naquela altura um tio dele, um padre de Notre-Dame, para afastá-lo das tentações da vida parisiense, inseriu-o numa confraria religiosa, a dos padres oratorianos. Tratava-se de um grupo de nobres carolas que só pensavam em meditar e rezar. Aos 22 anos saiu de lá como sacerdote e tudo poderia ter ficado na mesma se ele não ficasse repentina e inteiramente fascinado por Descartes.
Certo dia estava passeando no Quai des Augustins quando um livreiro amigo deteve-o na porta da livraria.
     Olá, Nicolas, como vai você?
     Muito bem, e você? – ele respondeu.
     Já leu o último livro de Descartes?
     Não, qual?
     O que fala do homem. O da razão. Descartes escreveu-o vinte anos antes de morrer, mas amoleceu e não teve a coragem de entregar ao prelo. Depois daquilo que aconteceu com Galileu, corria o risco de vê-lo queimado em praça pública. Agora, no entanto, os discípulos decidiram publicar.
E foi assim que Malebranche, em 1664, leu o Tratado do homem, de Descartes. Foi para ele uma leitura tão esclarecedora que acabou se convencendo de que era, logo ele tão cheio de dúvidas e de defeitos, o protagonista do livro. Compreendeu, por exemplo, que na vida a razão podia ser mais útil que a fé, e ficou tão convencido disso que às vezes sentia-se forçado a fechar o livro “para não se deixar levar pela excitação”.
Morreu em 1715.

As obras
Entre as suas obras, a que mais merece ser lembrada é a primeira: a Busca da verdade, publicada em 1675, à qual se seguiram, um depois do outro, o Trattato  della natura e  della grazia  (1680),  o Trattato sulla morale e principalmente as Conversazione sulla metafisica, no qual  faz  um  resumo, para os que porventura ainda não tivessem compreendido o seu pensamento, de todas as suas ideias.

O pensamento
Como era de esperar, Malebranche também teve seus inimigos. Primeiro um certo Foucher o acusou de heresia, depois o jesuíta Le Valois o atacou quanto ao conceito de “eucaristia” e, finalmente, um homem insidioso, chamado Arnauld, conseguiu botar no Índex todos os livros que ele tinha escrito. Quer dizer, como muitas vezes acontece com os autores bem-sucedidos, quanto mais as suas obras eram do agrado do público, mais ele era atacado pelos críticos.
Mas qual era, afinal, o seu assunto preferido? Pois bem, era a contraposição entre a Alma e o Corpo, ou, para usarmos as palavras de Descartes, entre a res cogitans e a res extensa. Ele, Malebranche, estava convencido de que tanto a Alma quanto o Corpo cuidavam cada um da sua própria vida e a respeito disto escreveu:
Não há qualquer relação de causalidade entre um Corpo e um Espírito, e tampouco entre um Corpo e outro Corpo. Nenhuma criatura, em resumo, pode agir sobre outra. E o fato de Deus poder desejar esta união, sempre foi e continua sendo para mim um mistério.
A Alma, Malebranche precisa, pensa em Deus, enquanto o Corpo cuida das coisas práticas do dia a dia. O problema é que, enquanto do Corpo sabemos tudo, da Alma não sabemos quase nada. Só sabemos que existe. E como sabemos disto? Sabemos porque “sentimos”. E como conseguimos “sentir”? Pois é, lá vamos nós novamente nas águas de Descartes: “... se penso que existe... quer dizer que existe.”

A propósito de Malebranche,
e da distinção entre Alma e Corpo,  proponho ao leitor um breve conto  de  ficção científica para que possa entender em que parte do corpo se esconde a alma:
O xeque Imm Hortal, de cinquenta anos, certo dia decide que quer ser clonado.  Um amigo dissera para ele: “Meu caro Imm, tu és muito rico. Convém te fazeres clonar para que possas sempre dispor de um corpo para eventuais transplantes. Para ti, seria uma espécie de almoxarifado. Vamos dizer que daqui a uns tempos precises, sei lá, de um fígado, ou de um coração, de um rim... pois é, no problem, só precisarias tirá-lo do clone e colocá- lo em ti.”
Imm aceita o conselho: contrata por milhares de dólares uma equipe de cirurgiões  famosos e cria um clone à sua imagem e semelhança. Em seguida esconde-o numa ilha perdida para que ninguém acabe sabendo da coisa. Depois, já com setenta anos,  percebe que graças a Alá nunca precisou de um transplante, e o que decide fazer, então? Manda transplantar o cérebro, o dele, no corpo do clone, e recomeça a  viver como se  estivesse  outra vez com vinte anos. E não é só: também espera poder fazer o mesmo de novo dali a cinquenta anos. A clonagem, para ele, tornou-se um meio de imortalidade. Afinal, o seu nome, Imm Hortal, lido de uma só vez soa justamente como “imortal”.
Nessa altura pode-se perguntar: e onde estaria a alma de Imm? No velho corpo, o que ele mandou sucatear, ou no novo, ou então no cérebro que continua sendo o mesmo?

Compartilhar:
←  Anterior Proxima  → Inicio

0 comentários:

Postar um comentário

Seguidores

website translator

Postagens mais visitadas do Site

Postagens mais visitadas da semana

VISITAS AO SITE

visitantes on line

Total de visualizações