Corrente Filosófica Fenomenologia
O conhecimento da realidade essencial dos fenômenos e a
possibilidade
desse conhecimento foi preocupação constante da filosofia até princípios do
século XX, quando a fenomenologia deixou de olhar para os elementos exteriores
que cercam os fenômenos e passou a considerá-los em si mesmos, por seu reflexo
na consciência, como única maneira de apreendê-los.
Fenomenologia é o estudo dos fenômenos em si mesmos,
independentemente dos condicionamentos exteriores a eles, cuja finalidade é
apreender sua essência, estrutura de sua significação. É também um método de
redução, pelo qual o conhecimento factual e as suposições racionais sobre os
fenômenos como objeto, e a experiência do eu, são postas de lado, para que a
intuição pura da essência do fenômeno possa ser rigorosamente analisada. É o
estudo dos fenômenos, distinto do estudo do ser, ou ontologia.
Na história da filosofia, a fenomenologia tem três significados
especiais. Na segunda metade do século XVIII, era sinônimo de "teoria das
aparências", expressão cunhada pelo filósofo Jean-Henri Lambert para
distinguir a aparência das coisas do que elas são em si mesmas. Com Hegel, em
Phänomenologie des Geistes (1807; Fenomenologia do espírito), é uma espécie de
lógica do conteúdo e uma introdução à filosofia, história das fases sucessivas,
das aproximações e das oposições pelas quais o espírito se eleva da sensação
individual à razão universal, ou, para usar sua fórmula: "é a ciência da
experiência que faz a consciência". Foi com Husserl que a palavra ganhou, nas
primeiras décadas do século XX, o significado de que hoje se reveste, de estudo
dos fenômenos em si mesmos, que visa à evidência primordial, e de denominação
de um movimento que influiu de modo significativo no pensamento filosófico
dessa época.
A fenomenologia husserliana é uma meditação sobre o conhecimento.
Considera que aquilo que é dado à consciência é o fenômeno (objeto do
conhecimento imediato). Esse fenômeno só aparece numa consciência; portanto, é
a essa consciência que é preciso interrogar, deixando de lado tudo o que lhe é
exterior. A consciência, para Husserl, só pode ser entendida como intencional,
isto é, não está fechada em si mesma, mas define-se como uma certa maneira de
perceber o mundo e seus objetos. Mostrar os diversos aspectos pelos quais a consciência
percebe esses objetos e sob os quais eles lhe aparecem, o que a sua presença
supõe, constitui o estudo e o objetivo essencial da fenomenologia.
Para Husserl, portanto, a tarefa da filosofia é a pesquisa, exame
e descrição do fenômeno, como conteúdo da consciência. Trata-se de uma mudança
radical de sentido na orientação filosófica, antes voltada para as coisas, para
o mundo exterior, e que com ele passou a interessar-se pela consciência, pelo
mundo interior. Assim, por exemplo, se alguém vê as folhas de uma palmeira
serem agitadas pelo vento, essa experiência é, toda ela, um fenômeno interior,
que se passa essencialmente dentro da consciência. Os objetos exteriores são
apenas condições para que se crie a percepção, a vivência desse fenômeno interior.
A fenomenologia se prende, por meio da atitude reflexiva, nesses fenômenos ou
estados da consciência e prescinde da realidade exterior das coisas, ou como
diz Husserl, coloca-se entre parênteses. É o que ele chama de epokhé, ou seja,
o ato de liberar a atenção do exterior para que ela se detenha na análise da
vivência ou experiência pura.
A fenomenologia é, portanto, uma descrição daquilo que se mostra
por si mesmo, de acordo com o "princípio dos princípios": toda
intuição primordial é fonte legítima de conhecimento. Situa-se como anterior a
toda crença e juízo e despreza todo e qualquer pressuposto: mundo natural,
senso comum, proposição científica ou experiência psicológica.
Essa mudança de orientação teve grande importância para a
filosofia, pois a eximiu de cuidar da explicação do mundo e das coisas. A
ciência é que explica o mundo e seus aspectos acessíveis à nossa experiência.
Ao voltar-se para o conteúdo ou para o fenômeno existente na consciência, a
fenomenologia encontrou um objeto que a capacita a transformar-se em ciência
autêntica, como pretendia seu fundador. Esse conteúdo é antes suscetível de
descrição do que de medida. Fazer tal descrição é a tarefa dessa filosofia.
Os críticos da obra de Husserl dividem-se em dois grupos
principais. De um lado estão os que, como os neokantianos, concordam em que a
fenomenologia se realizou como perspectiva ontológica; do outro, os que
sustentam que ela significou apenas uma tomada de posição epistemológica, como
Nicolaio Hartman. Em outras palavras, os que admitem ser ela uma perspectiva do
ser, e os que a consideram apenas como uma investigação do conhecer.
Em seus primeiros escritos, Husserl não põe em dúvida a existência
dos objetos independentemente dos atos mentais. Mais tarde, introduz a noção
problemática de uma redução transcendental fenomênica, mediante a qual se
descobre o ego (o eu) transcendental, diferente do ego fenomênico da
consciência ordinária. Em conseqüência, Husserl passa de um realismo primitivo
a uma modalidade de idealismo kantiano. Sua influência foi muito profunda, em
especial entre os existencialistas (Martin Heidegger, Jean-Paul Sartre, Maurice
Merleau-Ponty) que, apesar de se considerarem fenomenologistas, preocupavam-se
mais com a ação do que com o conhecimento.
Em psicologia, fenomenologia é um método de descrição e análise
desenvolvido a partir da fenomenologia filosófica, aplicado à percepção
subjetiva dos fenômenos e à consciência, em especial nos campos da psicologia
da Gestalt, análise existencial e psiquiátrica.
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