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  Olá pessoal! Depois de um tempo, estou retomando as atividades por aqui. Uma das razões que contribui para esse hiato foi a falta de tempo...

sábado, 9 de novembro de 2019

História da Filosofia: Período helenístico


O período helenístico
O Período Helenístico (ou Helenismo) foi uma época da história compreendida entre os séculos III e II a.C. no qual os gregos estiveram sob o domínio do Império Macedônico.
Foi tão grande a influência grega que, após a queda do Império, a cultura helenística continuou predominando em todos os territórios anteriormente por eles dominados.
Entre os séculos II e I a.C., os reinos helenísticos foram aos poucos sendo conquistados pelos romanos.
No mundo helenístico há, no entanto, um fenômeno mais impressionante do que qualquer batalha de Alexandre: gregos, egípcios, persas, hebreus, mesopotâmicos e hindus, culturas tão ricas e distintas, passaram a ter contato. Surgia uma cultura nova, nem grega, nem oriental, mas híbrida, sincrética, sendo, por isso, chamada de cultura helenística. A língua grega tornou-se a “língua comum” em toda a região conquistada por Alexandre. O modelo das cidades gregas era exportado para o Oriente: nos territórios conquistados, Alexandre construiu cerca de 70 cidades, sendo Alexandria, no Egito, a maior cidade da época, eixo econômico e intelectual do Mediterrâneo Oriental.
A filosofia helenística surge nesse contexto histórico. Ela é fortemente marcada por uma preocupação central com a ética, aqui entendida como o estabelecimento de regras do bem viver, da “arte de viver”. É ilustrativo disso o famoso Manual, do romano Epicteto (50-125). Em outras palavras, com o fim da pólis grega e o advento das hegemonias (macedônica, romana ou bizantina), o homem deixou de ser analisado em sua condição de “animal político”, que deveria viver pela sua cidadania. O homem abondona perspectiva política ou desiludido com ela, passou a preocupar-se mais com sua felicidade pessoal. Num mundo pluralista e multicultural, ou seja, cosmopolita, o homem sentia-se desenraizado, e a pólis deixou de ser sua referência básica. ataraxia (“paz de espírito” ou “tranquilidade”), e não a política, leva os homens à eudaimonia (“felicidade”). Surgem nesse período os filósofos: Plotino, Zenão de Cítio, Epicuro, Cícero, o pensamento no mundo helenístico é usualmente associado a uma escola ou tradição. A originalidade, assim, tem menos valor que a vinculação a um grupo. Muitas escolas helenísticas, por isso, foram acusadas de dogmáticas e doutrinárias, por deixar de lado o aspecto polêmico e dialético da filosofia grega. Além do mais, elas são profundamente ecléticas, por sintetizar diferentes doutrinas. 
O período helenístico também ajudou a criar correntes filosóficas que influenciaram diversas vertentes filosóficas posteriores. As principais escolas foram:

• Estoicismo: essa corrente pregava a felicidade como equilíbrio, na qual o homem deveria aceitar todas as situações postas pela vida. Como foi uma escola que se adaptava aos contextos, acabou sendo a visão filosófica do helenismo que mais durou. Seu principal representante e fundador era Zênon de Cítion.  

• Epicurismo: esse sistema filosófico afirmava que os prazeres moderados contribuíam para o encontro do estado de equilíbrio e tranquilidade, onde todos os medos eram liberados. O conhecimento sobre o funcionamento do mundo diminuía o sofrimento corporal. O criador dessa escola foi o filósofo Epicuro, que deu nome a corrente.

• Ceticismo: o fundador desse sistema foi Pirro de Elis. A escola pregava o não julgamento das coisas, o desprezo pelas bens materiais e pela afirmação de que todo conhecimento humano é relativo. 

• Cinismo: iniciado pelo filósofo Antístenes, essa corrente defendia a rejeição dos desejos de riqueza, poder político e fama. Indicava que os homens deveriam viver com indiferença, sem pudor e cultuando as amizades.

As principais escolas helenísticas são a Estoica e a Epicurista.
Escola Estoica
A Escola Estoica foi fundada em Atenas, em 300 a.C., por Zenão de Cítio (344-262 a.C.), e desenvolvida por Cleantes (330-232 a.C.) e Crisipo (280-206 a.C.). Em Roma, os principais representantes do estoicismo foram Sêneca (4 a.C.-65d.C.), Epicteto (60-138) e o imperador Marco Aurélio (121-180).
O termo “estoicismo” deriva de stoa poikilé (“pórtico pintado”), local em Atenas onde os membros da escola se reuniam. O estoicismo é a primeira ética universal fundada numa igualdade de princípios de todos os homens: cada um deve se pensar como “cidadão do mundo”, isto é, um cosmopolita.
A noção de necessidade, ou destino (heimarmené), é muito forte no estoicismo: o homem deve resignar-se e aceitar os acontecimentos predeterminados. Isso não se traduz pela inação ou pelo fatalismo passivo. Devemos agir de acordo com os preceitos éticos e fazer o que julgarmos devido, mas devemos também aceitar as consequências de nossa ação e o curso inevitável dos acontecimentos. Segundo um exemplo famoso, se vejo alguém se afogando, devo salvá-lo, mas, se não o conseguir, não devo desesperar-me, pois era inevitável. É legítimo, portanto, um amor ao destino (amor fati).
Assim, os estoicos acreditam que, para manter nossa ataraxia, devemos nos preocupar apenas com o que podemos modificar (nossos pensamentos, ações, sentimentos).  O que não está ao nosso alcance, ou seja, o que não conseguimos modificar (morte, velhice, catástrofes naturais, a opinião dos outros) não deve ser alvo de nossas preocupações. O sábio, em vez de buscar mudar a ordem do mundo, deve saber mudar seus desejos. A liberdade é compreendida como adesão à necessidade do ser que sabe reconhecer na lei universal o que é mais apropriado à sua natureza primeira. Como disse Sêneca: “Deve-se aprender a viver por toda a vida e, por mais que tu talvez te espantes, a vida toda é um aprender a morrer”.

Escola Epicurista


Epicuro (341-271 a.C.), notabilizado por seu tratado Da Natureza, fundou sua escola em Atenas, em 306 a.C., reunindo-se com seus discípulos no Jardim (Kepos), que ficou conhecido na Antiguidade. O Jardim tornou-se uma comunidade filosófica que põe em prática a ideia de frugalidade, serenidade e amizade, a rejeição das superstições religiosas e as vaidades sociais. Os sábios constroem um pequeno mundo amistoso em que reinam livremente a sabedoria e a amizade, no qual são recebidos abertamente mulheres, crianças, escravos e estrangeiros.
Para Epicuro, o que nos afasta do soberano bem são os quatro grandes medos humanos: medo dos deuses, medo da morte, medo do sofrimento e medo da dor. Os quatro medos não têm razão de ser, pois são alimentados por crenças vãs. De fato, não são as coisas que nos atormentam, mas, sim, as elaborações e os pensamentos que temos delas. A morte, por exemplo, não deve ser temida, pois, se pensarmos, veremos que não há por que ansiar a imortalidade. Além disso, a morte “não é nada em relação ao homem: ou ela existe e ele não existe ou ele existe e ela não existe”. A morte de um amigo não nos deve fazer infelizes, pois não é um mal para ele.
Para os epicuristas, o homem age eticamente na medida em que dá vazão a seus desejos e necessidades naturais de forma equilibrada ou moderada, e é isso que garante a ataraxia, porque “aprender e gozar andam juntos”. A valorização do prazer (hedoné) como algo natural e a concepção de que a realização de nossos desejos naturais e espontâneos é positiva deram origem à imagem, certamente distorcida, de que o epicurista é alguém devotado a uma vida cirenaica de prazeres. Ao contrário, o prazer excessivo joga-nos novamente na dor, que por sua vez nos leva à ação viciosa. Existem três tipos de prazeres: os naturais e necessários, que devemos buscar, pois a não satisfação causaria em nós uma dor real; os nem naturais nem necessários, cuja não satisfação não causaria uma dor verdadeira, e, portanto, artifícios da vaidade devem ser evitados; e os naturais, mas não necessários (como um bom vinho ou o amor), que devem ser evitados.

Escola cética

O Ceticismo é uma doutrina filosófica, surgida na Grécia em IV a.C, durante o período helenístico. A primeira escola cética foi fundada por Pirro de Élis (365/60-275/70 a.C) e a inspiração do filósofo para criá-la teria se originado de uma série de viagens feitas ao lado de Alexandre, o Grande, nas quais teria passado por países como Índia e Pérsia, e conhecido grandes sábios desses locais. Pirro não deixou nenhuma obra escrita e dentre as principais fontes do Ceticismo, encontram-se Diógenes Laércio, Cícero, Tímon e Sexto Empírico. Ao longo da história da filosofia, os principais representantes do Ceticismo, foram Pirro (fundador da primeira escola cética, conforme já citado), Tímon de Filonte (díscupulo de Pirro – 320 – 230 a.C), Arcesilau (315-240 a.C), Carnéades (219-129 a.C), Enesidemo (século I d.C), Agripa (séculos I e II d.C) e Sexto Empírico (160-210 d.C).
Pirro, fundador da primeira escola cética.
  Podemos considerar que o principal aspecto do Ceticismo é a epoché“, que significa suspensão do julgamento, ou, mais precisamente, a valorização de uma postura de neutralidade do juízo diante de qualquer questão apresentada. Assim como ocorria com o Epicurismo e com o Estoicismo, a finalidade de tal postura era a busca pela ataraxia (imperturbabilidade da alma) e, portanto, a obtenção da ausência das inquietações, angústias e ansiedades. Os céticos acreditavam que nem sempre haveria dois lados divergentes, de mesma validade argumentativa e de possibilidade numa determinada investigação e, por isso, não se deveria formar opinião sobre nenhuma delas, nem ter plena certeza de nada, tal como seria impossível se afirmar ou negar algo. Além da epoché, outro importante princípio do Ceticismo é a crença de que o mundo que experimentamos em nosso cotidiano é puramente fenomênico (isto é, aparente) e também por isso, não poderia haver evidências certas ou compreensão absoluta de nada, sendo que, portanto, para os céticos, vivemos num mundo caracterizado essencialmente pela incerteza. Consequentemente, esses filósofos mantinham-se sempre no âmbito da dúvida e da constante busca (chamada de sképsis), e não estabeleciam afirmações e tampouco negações: “(…) a investigação cética é, por definição, interminável, pois jamais levará a uma conclusão definitiva.”

Sexto Empírico, na obra Hipoteposes, faz um esclarecimento válido de menção: o cético não rejeita aquilo que provém das impressões sensíveis, ou seja, do que sentidos fornecem, como, por exemplo, a sensação de frio ou calor. Porém: “(…) ele diz aquilo que lhe parece e relata o que sente de forma não-dogmática, sem afirmar nada de positivo sobre o que existe na realidade.” (EMPÍRICO, p. 118). Ainda no mesmo livro, mais adiante, fornece outro exemplo acerca da realidade sensível, ao afirmar que não sabe se o mel é realmente doce, mas apenas que lhe parece doce: “(…) se é doce em si mesmo é algo questionável, pois não se trata mais de uma aparência, mas de um juízo sobre o aparente”. (EMPÍRICO, p. 119). Ou seja, será aquilo que sentimos e captamos, corresponde ao que tal objeto é de fato? Para os céticos, simplesmente não é possível tirar quaisquer conclusões que estejam além daquilo que se apresenta como mera aparência e qualquer tipo de conclusão sobre algo que está além da percepção cairá no dogmatismo, que foi fortemente combatido pelos céticos pirrônicos.
Escola cínica
A Escola Cínica, ou o Cinismo, foi uma corrente de natureza moral um tanto quanto exagerada, portanto, fora dos padrões normais, que ocorreu no Período Pós-socrático, justamente para combater a cultura degenerada da época. Essa corrente foi como que preparatória para o surgimento de outras escolas desse período, tal como se estivesse antevendo a época posterior que iria se desenhar na Grécia com a desencarnação de Alexandre, o Grande, em que a cultura grega iria decair do nível que antes foram determinados pelo Período Doutrinário e pelo Período Sistemático, através da degeneração da moral e da ética, assim como da implantação da monarquia na Grécia Antiga, que tanto lá como nos arredores iria se instalar.
O primeiro veritólogo a definir a Escola Cínica foi Antístenes, discípulo de Sócrates, no final do século V a.C., o qual foi seguido por Diógenes de Sínope, que levou o Cinismo a ultrapassar aos extremos da lógica e passou a ser visto como sendo o arquétipo do Cinismo, já que a sua autossuficiência e a sua indiferença demonstradas perante as vicissitudes da vida espelhavam os ideais do cinismo, que então se espalhou durante a ascensão do Império Romano, no século I, tornando-se quase um movimento de massa, já que os seus seguidores eram encontrados tanto pedindo esmolas como pregando ao longo das cidades do Império. A doutrina finalmente desapareceu no final do século V, com o falso cristianismo primitivo adotando muitos dos seus ensinamentos e das suas práticas ascéticas e retóricas.
A denominação de cínico é proveniente do grego antigo kynikos, que significa igual a um cão, sendo que em grego a palavra kyon significa cão, cujo genitivo é kynos, como acontece nas línguas em que os nomes se declinam por casos, sendo a manifestação com que se exprime em geral o complemento possessivo, limitativo e, às vezes, o circunstancial ou terminativo. Mas a explicação existente desde os tempos antigos do porquê dos cínicos serem denominados de cães, deve-se ao fato de Antístenes, que foi o primeiro cínico, ensinar no ginásio Cynosarges, ou Cinosargo, um ginásio e templo para os atenienses nothoi, ou seja, aqueles que não possuíam a cidadania ateniense por terem nascido de uma escrava, estrangeira, prostituta, de pais cidadãos mas não legalmente casados, ou, ainda, que fossem bastardos de hilotas, cujo nome designa uma raça escrava da antiga Esparta. A palavra Cynosarges sugere os significados de alimento de cão, cão branco ou cão rápido.
Mas ao que tudo indica, a denominação de cão foi também lançada aos primeiros cínicos como um insulto pelas suas rejeições exageradas quanto aos costumes adotados, o que implica em total desprezo em relação às convenções sociais, já que eles decidiram adotar os seus próprios costumes de natureza ascética, ao viverem nas ruas. O próprio Diógenes de Sínope, em particular, foi referido como o cão, ao ter afirmado que “os outros cães mordem os seus inimigos, eu mordo os meus amigos para salvá-los”, ao que tudo indica tentando transformar o significado da palavra em seu favor, como se através da mordida ele estivesse inoculando os atributos morais nas carnes dos seus amigos. Mas tal exagero de viver a vida em tais condições não condiz com a verdadeira moral, pois foge a ela, já que esse procedimento não condiz com a natureza, apesar dos cínicos considerarem que estavam vivendo em conformidade com ela. Mas, mesmo assim, um comentarista tenta dar uma explicação para o estilo de vida e a denominação canina aos cínicos, quando diz o seguinte:
Há quatro razões de porque os cínicos são assim chamados. A primeira razão por causa da indiferença do seu modo de vida, pois fazem um culto à indiferença e, assim como os cães, comem e fazem amor em público, andam descalços e dormem em banheiras nas encruzilhadas. A segunda razão é que o cão é um animal sem pudor, e os cínicos fazem um culto à falta de pudor, não como sendo falta de modéstia, mas como sendo superior a ela. A terceira razão é que o cão é um bom guarda e eles guardam os princípios da sua filosofia. A quarta razão é que o cão é um animal exigente que pode distinguir entre os seus amigos e inimigos. Portanto, eles reconhecem como amigos aqueles que são adequados à sua filosofia, e os recebem gentilmente, enquanto os inaptos são afugentados por ele, como os cães fazem, ladrando contra eles”.
Por aqui se pode constatar plenamente o exagero extremo em busca da moral, em que nesse extremo exagero a ética é quase que completamente esquecida, o que se leva a concluir que os cínicos não eram verdadeiramente educados, pois que para o ser humano ser educado verdadeiramente, ele deve possuir os atributos morais e éticos. Além do mais, nenhum ser humano deve olvidar de viver a vida em conformidade com a sociedade, mas tendo sempre como foco da sua vida aquilo que diga respeito à virtude, o que não implica em agredi-la.
Os cínicos, tanto os gregos como os romanos clássicos, consideravam a virtude como a única necessidade para realizar a felicidade, vendo-a como inteiramente suficiente para tanto. Mas nessa busca pela felicidade eles negligenciavam com rudeza a sociedade, a higiene, a família, o dinheiro, etc., denotando assim uma elevada dose de falta de ética. Assim, eles procuravam se libertar das convenções estabelecidas pela cultura local, na tentativa de se tornarem autossuficientes, em razão da crença equivocada de que estavam vivendo de acordo com a natureza. Como consequência desse desvirtuamento, eles rejeitavam todas as formas convencionais de felicidade que envolvessem dinheiro, poder, fama, etc., a fim de viverem asceticamente de maneira virtuosa e, portanto, feliz.
Mas se os cínicos antigos por um lado rejeitavam os valores sociais convencionais, por outro lado criticavam fortemente alguns tipos de comportamentos prejudiciais ao convívio humano, como a avareza, o egoísmo, a ganância, etc., que eram vistas como causadoras dos sofrimentos. Uma maior ênfase sobre este aspecto dos seus ensinamentos levou à compreensão moderna do que seja cinismo, já no final do século IX, considerado como sendo a manifestação de uma atitude de desdém negativo ou cansaço da vida, proveniente de uma desconfiança geral quanto à integridade ou motivos professos dos outros. Mas esta definição moderna se encontra em contraste marcante com o pensamento antigo, que destacou a virtude e a liberdade moral na libertação do desejo.
Na realidade, o propósito da vida para os cínicos era viver na virtude, na mais extremada virtude, de acordo com os ditames da natureza, a qual eles não sabiam interpretar nem o seu conteúdo e nem o seu objetivo para a vida, por lhes faltar a sabedoria necessária para tanto. Nas suas ignorâncias acerca da natureza, eles traçavam os objetivos essenciais para as suas vidas, em que predominava a virtude moral, que somente poderia ser obtida se eliminando o desejo de todos os bens supérfluos, assim como tudo aquilo que fosse exterior a eles.
Daí a razão deles defenderem a tese de que o ser humano dispunha de tudo aquilo que necessitava para viver, independente dos bens materiais. A isto denominavam de autarcia, uma variante com outra acepção mais difundida de autarquia, ou a qualidade de quem se basta a si mesmo, que pretendia exprimir uma condição de autossuficiência do sábio, algo que eles não eram, a quem basta ser virtuoso para ser feliz. Mas o termo grego original é autarkeia, que significa autossuficiência. Além dos cínicos, tal concepção se consagrou em uma proposição defendida também pelos estoicos, como veremos mais adiante em outro tópico, neste site de A Filosofia da Administração.
Os cínicos desacreditavam das conquistas obtidas por esta civilização, rejeitando as suas estruturas jurídicas, sociais e credulárias, estas últimas corretamente, pelo fato de serem todos os credos e as suas seitas sobrenaturais, afirmando que elas não trariam qualquer benefício ao ser humano. Considerando-se autossuficientes, eles rejeitavam tudo aquilo que naturalmente não é dado ao ser humano pelo nascimento, ao que parece se referindo até ao instinto, que é irracional, que não pode servir de base para a conceituação nem da moral e nem da ética. Em outros termos, este pensamento pode ser encontrado no mito Bom Selvagem, de Rousseau.
Os conhecimentos metafísicos acerca da verdade, por serem provenientes da percepção criptoscópica, devem ser transmitidos por intermédio de uma saperologia, antes de uma filosofia, com a inserção de algumas experiências físicas acerca da sabedoria, para que assim possam ser acessíveis à compreensão intelectual. No entanto, o cinismo não conseguiu penetrar no âmbito da verdade, já que a sua saperologia partia do princípio de que a felicidade não dependia de nada externo ao próprio ser humano, tais como as coisas materiais, sem qualquer preocupação com a saúde, com o sofrimento doloroso e mesmo com a desencarnação, limitando-se estritamente ao âmbito da moral, mesmo sem atingi-la a contento, pois que dela o pudor faz parte integrante, mas preconizando a virtude para se atingir a felicidade, em que desponta a sua saperologia no ensinamento da libertação de todas as coisas materiais, para eles a única via pela qual se pode atingir a felicidade, que, assim obtida, nunca mais pode ser perdida. Assim, para os cínicos a virtude reside, sobretudo, na conduta moral do ser humano, naquilo que lhe é intrínseco, não nas conquistas materiais, e muito menos na aparência exterior.
Mas assim como Sócrates, os cínicos nada deixaram de escrito. O que se sabe sobre eles foi narrado por escritores alheios aos seus ensinamentos moralistas, que em geral eram críticos severos dos seus modos de vida, pelo fato de serem alheios à cultura e a sociedade.
Assim como a preocupação com o próprio sofrimento doloroso relativo ao seu ascetismo, tanto a saúde como a desencarnação, assim como o sofrimento doloroso dos seus semelhantes, representavam algo do qual os cínicos também almejavam se libertar. Em virtude disso, a palavra cinismo adquiriu a conotação que hoje em dia tem de indiferença e insensibilidade ao sentir e ao sofrer dos semelhantes, ou mesmo aquele que afronta ostensivamente as convenções e conveniências morais e sociais.
Por volta do século dezenove, a ênfase sobre os aspectos negativos da doutrina cínica levou ao entendimento moderno de cinismo a significar desfaçatez, tal como uma disposição de descrença na sinceridade ou bondade das motivações e ações humanas, e também como a caracterização de pessoas que desprezam as convenções sociais.
História da Filosofia


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